Até 1960, boa parte dos filmes de terror tinha como encarnação do mal algum tipo de criatura sobrenatural, como
vampiro,
lobisomem
ou outra assombração. Mas um aparentemente pacato e bonzinho gerente de
um motel à beira da estrada modificaria esse panorama. O nome dele era
Norman Bates. Interpretado pelo ator Anthony Perkins, ele tornou-se um
dos mais marcantes personagens no cinema ao mostrar que a monstruosidade
que tanto nos apavora não vem do além, mas principalmente nasce dentro
do próprio ser humano. Bates era o personagem central do filme
“Psicose”, uma das várias obras-primas do diretor inglês Alfred
Hitchcok, que é reconhecido como o “
mestre do suspense” na sétima arte.

Considerado um dos melhores diretores de cinema de todos os tempos,
Hitchcock provocou verdadeiras revoluções conceituais e técnicas na arte
cinematográfica. Muitos dos 60 filmes que ele dirigiu, entre 1922 e
1976, continuam a influenciar e ser referência para o cinema feito em
várias partes do mundo. Apesar disso, ele nunca ganhou um
Oscar
de melhor diretor, mesmo tendo sido indicado em cinco ocasiões, com os
filmes “Rebecca, a Mulher Inesquecível” (1940), “Um Barco e Nove
Destinos” (1944), “Quando Fala o Coração” (1945), “Janela Indiscreta”
(1954) e “Psicose” (1960). Para não dizer que deixou de reconhecer o
talento do diretor, em 1967, durante a 40.ª cerimônia anual do Oscar, a
Academia de Artes e Ciências Cinematográficas entregou a ele o Irving G.
Thalberg Memorial Award.
A trajetória do “mestre do suspense” começa em Londres no fim do século
19. Alfred Joseph Hitchcock nasceu em 13 de agosto de 1899. Filho de um
comerciante de aves, ele passou seus anos escolares num colégio jesuíta,
o St. Ignatius College. Depois, ele foi estudar engenharia na
Universidade de Londres. Em 1920, Hithcock começou a trabalhar na
indústria cinematográfica, fazendo os letreiros que apareciam nos filmes
mudos produzidos pela Famous Players-Lasky Company. Nos anos seguintes,
ele escreveria roteiros e seria assistente de direção até que em 1925
obteve a chance de dirigir seu primeiro filme: “The Pleasure Garden”.

Seu talento para o suspense aparece pela primeira vez no filme “O
Inquilino” (1926), que mostra a história de uma família que desconfia
que seu inquilino seja
Jack, o Estripador.
Em 1929, Hitchcock emplaca seu primeiro sucesso no Reino Unido com
“Chantagem e Confissão”. O filme abriria um período de vários clássicos
do suspense dirigidos por ele ainda em solo britânico, como “O Homem que
Sabia Demais” (1934), “Os 39 Degraus” (1935), “Sabotagem” (1936) e “A
Dama Oculta” (1938). Nessa fase, ele estabelece algumas inovações que
caracterizariam seu estilo. Uma delas é a introdução de um recurso de
roteiro que virou uma de suas marcas registradas: o personagem inocente
que é perseguido ou punido por um crime que não cometeu.
O
sucesso desses filmes chamou a atenção dos produtores de Hollywood para a
habilidade do diretor em usar o suspense, a partir de tramas plausíveis
em que explorava psicologicamente os temores humanos. Em 1939,
Hitchcock mudou-se para os Estados Unidos, onde realizaria a maior parte
de suas obras-primas.
A estreia de Alfred Hitchcock em Hollywood não poderia ter sido melhor. Sua primeira produção na América é “
Rebecca, a Mulher Inesquecível” (1940), vencedora do
Oscar
de melhor filme. O mais incrível é que esse foi o único filme do
diretor a ganhar um Oscar nessa categoria. A obra gira em torno do
romance entre um rico viúvo e uma inocente jovem, que acabam se casando
rapidamente. Tudo parecia perfeito, até que Rebecca, a falecida esposa,
volta para assombrar a jovem.

Nas três décadas seguintes, Hitchcock dirigiu praticamente um filme por
ano em Hollywood. A partir de 1948, ele virou seu próprio produtor e
atravessou os anos 1950 com uma série de filmes de suspense com grandes
orçamentos e contando com algumas das principais estrelas do cinema
norte-americano. Um dos primeiros grandes sucessos dessa época foi “
Janela Indiscreta”
(1954). No elenco James Stewart e Grace Kelly, que fazem o par de
protagonistas nesta memorável obra sobre voyeurismo, obsessão e intriga.
James Stewart interpreta um fotógrafo bem-sucedido que é obrigado a
passar os dias em seu apartamento por conta de uma perna quebrada. O que
lhe resta é espiar os vizinhos e numa dessas acaba desconfiando que um
deles assassinou a esposa. Grace Kelly faz sua namorada num roteiro de
suspense que se desenrola numa atmosfera de sensualidade e humor negro.

Entre os tantos sucessos de Hitchcock nos anos 50, outro que se destaca é “
Um Corpo que Cai”
(1958). O filme foi lançado no auge da fama do diretor e, por incrível
que pareça, não foi muito bem recebido pela crítica. Mais uma vez James
Stewart está no papel central, num filme que influenciou vários
diretores e roteiristas nas décadas seguintes. Stewart faz um policial
de São Francisco que pede demissão por conta de seu medo de altura e
passa a trabalhar como detetive particular. Em um de seus primeiros
trabalhos tem como missão seguir a esposa de um velho amigo,
interpretada por Kim Novak, que faz uma loura fria e obcecada por uma
antepassada. Paranóia, perversão e manipulação fazem parte de uma trama
complexa e perturbadora.
Na virada dos anos 1950 para a
década de 60, Hitchcock dirige outra obra-prima do cinema: “
Psicose”.
O filme que ajudou a mudar a abordagem cinematográfica sobre o terror é
cheio de sequências magistrais, como os assassinatos no chuveiro e na
escadaria. A reação do público foi impressionante, com filas que
dobravam os quarteirões e muita gritaria na plateia nas cenas mais
aterrorizantes. Três anos depois, ele voltaria a surpreender com a
filmagem de “
Os Pássaros”. Muito mais próximo do terror
do que do suspense, o filme é um dos mais enigmáticos na obra do
diretor. A história mostra o inexplicável ataque de pássaros contra os
habitantes de uma pacata cidadezinha litorânea. Nos anos seguintes,
Hitchcock dirigiria ainda mais alguns sucessos como “Marnie, Confissões
de Uma Ladra” (1964) e “Frenesi” (1972).

Os filmes de Hitchcock geralmente tiveram como tema central assassinatos
e espionagens. Dentro desses temas, ele soube construir narrativas que
giraram em torno basicamente de três elementos que caracterizam sua
obra. O mais comum é aquele em que um inocente é erroneamente acusado ou
condenado por um crime e que, para se ver livre, acaba assumindo a
missão de perseguir e encontrar o real culpado. Outro elemento muito
presente na sua obra é a vilã, normalmente uma mulher sensual, que seduz
um protagonista masculino para acabar sendo salva por ele ao mesmo
tempo em que o destrói. E um terceiro elemento que caracteriza a
filmografia de Hitchcock é a do assassino psicopata cuja identidade é
revelada ao longo da ação. Além dessas características nas tramas, a
obra de Hitchcock trouxe inovações técnicas nas posições e movimentos
das câmeras, nas elaboradas edições e nas surpreendentes trilhas sonoras
que realçam os efeitos de suspense e terror.

Alguns meses após receber o título de “cavaleiro do Império Britânico”,
Sir Alfred Hitchcock morreu em Los Angeles, em 29 de abril de 1980.
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