A história, como tantas outras, é controversa, mas o que se comenta por aí é que o nome dele é Logan, somente Logan. Um canadense que cresceu nas montanhas e florestas geladas daquele país e que em determinado momento sofreu uma mutação natural em seu DNA que lhe conferiu resistência e força física descomunais, um absurdo poder de cura – tanto para cortes e perfurações, como para eliminar toxinas de seu corpo –, e sentidos tão aguçados quanto aqueles comuns apenas aos melhores lobos da alcatéia. Em essência é esse o nosso herói, só que com garras retráteis e ossos de adamantium (o metal mais resistente de todo o universo Marvel).

Sua juventude foi por muito tempo um dos grandes mistérios da fauna Marvel. Até a chegada da mini-série Origins (Origem, pela publicação brasileira) tudo o que se sabia do malvadão era aquilo que o cartunista britânico Barry Windsor-Smith havia escrito e desenhado em “Arma X”, que não passava de sua própria concepção para a origem do personagem – que sequer lhe pertencia. Na época, Windsor-Smith recebeu inúmeros elogios pela trama, mas algumas dúvidas ainda permaneciam na cabeça dos leitores e Chris Claremont (o autor regular dos X-Men naquela época) não pôde sanar a curiosidade dos fãs. Isso porque Barry entregou sua história com certo tempo de atraso. Estava feita a besteira? Não, em absoluto. Mal sabiam eles que essa lacuna criada despropositadamente acabaria por tornar o personagem ainda mais envolvente. “O Wolverine ganhou muita fama justamente por ser um cara sem passado. Ninguém sabe ao certo de onde ele surgiu, como conseguiu seus poderes ou mesmo a sua verdadeira idade. Isso tudo, quando somado ao caráter genioso do personagem, atribuiu a ele o status que poucos heróis conseguiram atingir dentro do universo dos quadrinhos”, conta o desenhista e fã de HQ’s Rafael Vilarino.
Segundo Vilarino, há registros no mundo dos quadrinhos que dão conta da presença de Wolverine em importantes confrontos da história, como a Guerra Civil Americana e a Segunda Guerra Mundial - quando inclusive lutou ao lado do Capitão América -, mas em função de seu fator de cura mutante ele deixa grande parte de seus entusiastas com aquela pulga atrás da orelha: “será que ele é mais velho que o Professor Xavier?”, “ele é eterno?”, “de onde vem todo aquele ódio?”. Respostas definitivas ninguém tem, até porque isso acabaria com um tanto do glamour do personagem. Mas algumas características são fundamentais para entender não só o pensamento de Logan, como também o porquê de todo esse fascínio criado acerca de seu personagem.
“Diferentemente de heróis como o Homem-Aranha ou o Super-Homem, Wolverine nunca teve preocupações éticas ou morais. Ele é possivelmente o primeiro cara que faz uso dos poderes de um herói, com o perdão da palavra nesse caso, para encher a cara e não ficar bêbado, ao invés de ficar só naquela de salvar as pessoas e o mundo”, afirma Vilarino, que completa: “Isso tudo acabou aproximando-o de leitores saturados de histórias politicamente corretas e que sentiam falta de alguém mais ‘de verdade’, com problemas comuns ao nosso cotidiano. Daí o seu sucesso!”.
A história por trás de Wolverine tornou-se um emblema de negação à era em que vivemos. Hoje ele representa aquele sujeito que em hipótese alguma abaixaria a cabeça para o seu chefe ou para o estado repressor, o mesmo que insiste em chamar de democracia as mais esdrúxulas condições de desigualdade entre cidadãos. O personagem retrata aquilo que muitos de nós – possivelmente a maioria - gostaríamos de ser no dia-a-dia e que, em função da necessidade de pagarmos nossas contas e de alimentarmos a rotina cruel de sermos nós mesmos, não conseguimos romper.
“Para todos aqueles que diariamente se sentem sufocados de alguma maneira, seja no trabalho, na universidade, no trânsito e até mesmo pelos índices de violência que frequentemente são apontados pela TV, existe um Wolverine que faz sentido”, aponta, entre um trago e outro de seu cigarro Marlboro, Tiago Batista, estudante universitário e fã de X-Men desde que acompanhou o desenho pela primeira vez - e que já havia assistido ao filme “X-Men Origem: Wolverine” oito vezes. “Pior é que eu sei que todos se sentem sufocados”.
Hoje com 22 anos de idade recém completados, o estudante aponta o mutante das garras como um dos personagens mais populares e fascinantes do universo dos quadrinhos e desafia: “Pergunte a qualquer leitor que tenha o mínimo de contato com personagens criados pela Marvel quais são seus heróis favoritos. Duvido que encontrem alguém capaz de não citá-lo entre os cinco primeiros dedos da mão direita”.
Com tanto deslumbre envolvendo a sua figura, fica até estranho imaginar que, por muito pouco, ele não aconteceu. Segundo alguns registros espalhados pela grande rede, Wolverine seria um personagem morto hoje em dia caso Len Wein e o desenhista Dave Cockrum não o tivessem recrutado para se juntar a um grupo de mutantes novatos incumbidos de salvar os discípulos originais do Professor Xavier, que haviam sido capturados por um cara mal chamado Krakoa. Foi a partir de então que Logan se juntou em definitivo ao time do carequinha Xavier e passou a viver nos Estados Unidos. Com a saída de Cockrum, cujo X-Men favorito era o alemão Noturno, e a chegada de John Byrne na Marvel Comics, o estilão trucker-arrogante-com-sangue-nos-olhos-e-charuto-na-boca de Wolverine começa a empolgar leitores ao redor do mundo e o coloca ao lado de figurões do chamado “primeiro time” da empresa, como o Batman, Tocha-Humana, Homem-Aranha, Capitão América e outros um pouco mais sem graça, como Super-Homem, por exemplo.
Dentro de sua nova família, como ele se refere ao grupo dos X-Men, Wolverine já representou diversas funções. Em alguns episódios ele aparece como o semeador da discórdia entre eles, enquanto em outras fases ele cumpre o papel de tutor mental dos mutantes. Um personagem despojado, detentor de um humor ébrio e hipnotizante que oscila entre a felicidade e o ódio em questão de segundos. Talvez menos. Em seu íntimo, ao mesmo tempo que carrega o sonho utópico de uma sociedade onde humanos e mutantes, independente de todas as diferenças que os cercam, possam conviver pacificamente, ele também é aquele cara que só quer saber de beber seu Black Label e permanecer vivo para respirar o dia seguinte. Não é à toa que é considerado por muitos o maior herói dos quadrinhos modernos e também da indústria do entretenimento.
O ator australiano Hugh Jackman esteve no Brasil para divulgar “X-Men Origens: Wolverine” e deixou por aqui a melhor impressão possível. Sempre sorridente e tratando a todos com muita simpatia, o ator se hospedou no tradicional Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, e de lá teceu alguns comentários sobre os anos na pele do mutante mais encardido e estimado dos X-Men, e sua continuação nas telonas. “Já andei conversando com os roteiristas. Sou fã dos quadrinhos que mostram a missão dele no Japão. A idéia dos samurais é muito legal. Primeiro teremos que acompanhar se o público está disposto a assistir ao longa", disse o ator para a alegria dos fãs da série.
O vilão dessa continuação seria o mutante Cyber, que também possui poder de cura, superforça, poderes mentais e garras retráteis como as de Wolverine. Dente de Sabre também reapareceria na trama. Jackman em nenhum momento escondeu a sua paixão pelo personagem e comentou sua participação na produção do longa-metragem, que só no primeiro final de semana levou mais de um milhão de pessoas aos cinemas. “Produzir foi algo natural para mim. Depois de interpretar esse personagem por todo esse tempo, acho que já conheço bem o Wolverine”, contou à imprensa tupiniquim, e foi além: “acho que se alguém tem o direito de dizer quem Wolverine é, esse alguém sou eu”.
Antes de encerrar, o ator e produtor fez questão de deixar claro o motivo de todo o carinho pelo mutante, transparecendo que sua maior preocupação no filme era manter intacta tanto a história, quanto a integridade de Wolverine: “Estamos lidando com um personagem que é provavelmente um dos mais sombrios já criados pelos quadrinhos. O filme tem muitos elementos divertidos, mas existem camadas de dor e escuridão nesse papel”.